Como se Desenvolve a Homossexualidade? Juntando as Peças

Jeffrey B. Satinover, M.D.

Jeffrey B. Satinover, M.D. pratica psicanálise há mais de dezanove anos e psiquiatria há mais de dez. Foi Fellow em Psiquiatria e Psiquiatria Infantil na Universidade de Yale, antigo presidente da C.G. Jung Foundation, e antigo “William James Lecturer” em Psicologia e Religião na Universidade de Harvard. Formado pelo MIT, pela Universidade do Texas e pela Universidade de Harvard. É o autor de “Homosexuality and the Politics of Truth” [A Homossexualidade e a Política da Verdade] (Baker Books, 1996).

Pode ser difícil de entender como os genes, o ambiente e outras influências se interrelacionam umas com as outras, como certo fator pode “influenciar” um resultado mas não ser causa dele, e como a fé entra aqui. O contexto que se segue está condensado e é hipotético, mas é oriundo das vidas de pessoas reais, ilustrando a quantidade de fatores que influenciam o comportamento.

Repare que o que se segue é apenas um dos muitos percursos desenvolvimentistas que podem conduzir à homossexualidade, mas é um dos mais comuns. Na realidade, o “caminho” para a expressão sexual de qualquer pessoa é individual, contudo pode partilhar muitos dos seus trechos com o caminho de outros.

(1) O nosso contexto começa com o nascimento. O menino (por exemplo) que um dia pode vir a deparar-se com a homossexualidade nasce com certas caraterísticas que são um pouco mais comuns entre homossexuais do que na população em geral. Alguns desses traços podem ser herdados (genéticos), enquanto outros podem ter sido causados pelo “ambiente intrauterino” (hormonais). O que isso significa é que um jovem sem esses traços vai ter menos probabilidade de se tornar homossexual no futuro do que alguém que os tem.

Quais são esses traços? Se os pudéssemos identificar com precisão, muitos acabariam por ser tornar dons em vez de “problemas”, por exemplo uma disposição mais “sensível”, uma forte propensão criativa, um sentido estético apurado. Alguns desses, tais como a maior sensibilidade, podem relacionar-se com – ou até estarem envolvidos em – traços fisiológicos que também causam problemas, tais como uma resposta de ansiedade a qualquer estímulo acima da média.

Ninguém tem certezas sobre quais serão exatamente essas caraterísticas hereditárias; de momento apenas temos pistas. Se fôssemos livres para estudar a homossexualidade adequadamente (sem a influência de agendas políticas), certamente iríamos clarificar muito em breve esses fatores – tal como estamos fazendo em áreas menos contenciosas. Seja como for, não existem absolutamente quaisquer provas que o comportamento “homossexualidade” seja por si só herdado diretamente.

 

(2) Desde tenra idade, caraterísticas potencialmente hereditárias marcam o menino como “diferente”. Ele se acha algo envergonhado e desconfortável perante as atividades típicas dos seus pares [N.T.: “rough and tumble” = atividades ou brincadeiras com uma forte dimensão física e que exigem que se lide bem com confusão, desordem, agressividade, perigo, etc.]. Talvez se interesse mais pela arte ou leitura – simplesmente porque é inteligente. Mas quando, mais tarde, reflete sobre a sua infância, ele vai achar difícil distinguir entre o que é nestas diferenças comportamentais se deve a um temperamento herdado e o que vem de outro fator, nomeadamente:

 

(3) Que, por qualquer razão, ele recorda um doloroso desencontro [“mismatch”] entre o que precisava e pelo qual ansiava e aquilo que o seu pai lhe deu. Talvez a maior parte das pessoas concorde que o seu pai era claramente distante e pouco influente; talvez simplesmente tenha acontecido que as suas necessidades eram tão únicas que o seu pai, um homem decente, nunca tenha conseguido encontrar a forma certa de se relacionar com ele. Ou talvez o seu pai realmente odiava e rejeitava a sensibilidade do seu filho. Em qualquer uma destas situações, a ausência de uma proximidade feliz, calorosa e íntima com o seu pai conduziu o menino a um afastamento por desilusão, “desvinculando-se defensivamente” de modo a se proteger a si mesmo.

Mas, infelizmente, este afastamento do seu pai, e do modelo “masculino” de que tinha necessidade, também o deixou ainda menos capaz de se relacionar com os seus pares masculinos. Podemos colocar esta situação em contraste com a do menino cujo pai amoroso morre, por exemplo, mas que é menos vulnerável à homossexualidade posteriormente. Isso é porque a dinâmica comum no menino pré-homossexual não é apenas a ausência de um pai – literal ou psicológica – mas a defesa psicológica do menino contra o pai que repetidamente o desaponta. De fato, um jovem que não forme esta defesa (talvez ao ter acesso a terapia cedo, ou porque existe outra figura masculina importante na sua vida, ou devido a temperamento) é muito menos susceptível de se tornar homossexual.

A dinâmica complementar que envolve a mãe do menino também pode ter um papel importante. Uma vez que as pessoas tendem a casar com parceiros com “neuroses interligadas”, o menino provavelmente deu por si no seio de uma relação problemática com ambos os pais.

Por todas estas razões, quando, em adulto, pensa sobre a sua infância, o homem que agora se entende como homossexual recorda, “Desde o início que fui sempre diferente. Nunca me dei bem com os meninos da minha idade e sempre me senti mais confortável perto das meninas.” Esta memória exata faz com que se sinta convencido de que a sua homossexualidade posterior foi como se estivesse “programada” desde o início.

 

(4) Apesar de se ter “desvinculado defensivamente” do seu pai, o jovem rapaz ainda carrega silenciosamente dentro de si um anseio tremendo pelo calor, amor e envolvência dos braços do pai que nunca teve nem pôde ter. Desde cedo, ele desenvolve ligações intensas, não sexuais, com rapazes mais velhos que admira – mas, à distância, repetindo com eles a mesma experiência de anseio e indisponibilidade. Quando ocorre a puberdade, impulsos sexuais – que se podem associar a qualquer objeto, sobretudo nos homens – surgem à superfície e combinam-se com a sua já intensa necessidade por intimidade e calor humano. Ele começa a desenvolver paixões homossexuais. Mais tarde, recorda, “Os meus primeiros desejos sexuais foram dirigidos a rapazes, não a raparigas. Eu nunca me interessei por raparigas.”

A intervenção psicoterapêutica neste momento e mais cedo pode ser bem sucedida na prevenção do desenvolvimento posterior da homossexualidade. Tal intervenção tem como objetivo, por um lado, ajudar o rapaz a alterar os seus padrões efeminados em desenvolvimento (que derivam de uma “recusa” em se identificar com o pai rejeitado), mas ainda é mais crítico o objetivo de ensinar o seu pai – se for capaz de aprender – como se envolver e relacionar adequadamente com o seu filho.

 

(5) À medida que vai amadurecendo (em particular na nossa cultura em que experiências sexuais precoces e extraconjugais são permitidas e até mesmo encorajadas), o jovem, agora adolescente, começa a experimentar atividades homossexuais. Ou em alternativa, as suas necessidades por proximidade com o mesmo sexo podem já ter sido aproveitadas por um rapaz ou homem mais velho, que se apoderou dele sexualmente quando ainda era criança. (Recordem-se os estudos que demonstram a alta incidência de abuso sexual nas histórias de infância de homens homossexuais.) Ou, por oposição, ele pode evitar tais atividades por medo e vergonha apesar da sua atração por elas. De qualquer modo, os seus anseios, que agora se encontram sexualizados, não podem simplesmente ser negados, por mais que lute contra eles. Posto isto, seria cruel dizer sobre tais anseios que se tratam de uma simples questão de “escolha”.

Na realidade, ele recorda ter passado meses e anos agonizantes em que tentou negar a sua existência por completo, ou procurou afastá-los, sem resultado. Podemos facilmente imaginar o quão furioso irá estar, justificadamente, quando alguém de modo casual e irrefletido o acusa de “escolher” ser homossexual. Quando procura ajuda, ele escuta uma de duas mensagens, e ambas o aterrorizam; ou, “Os homossexuais são más pessoas e você é uma má pessoa por escolher ser homossexual. Não há lugar para você aqui e Deus vai fazer com que você sofra por ser tão mau;” ou, “A homossexualidade é inata e imutável. Você nasceu assim. Esqueça a sua fantasia de conto de fadas de se casar e ter filhos e viver numa pequena linda casa. Deus fez quem você é e ele/ela destinou você para uma vida gay. Aprenda a desfrutar disso.”

 

(6) Em determinado momento, ele cede aos seus profundos anseios por amor e começa a ter experiências homossexuais voluntárias. Ele descobre – possivelmente com horror – que estes antigos, profundos e dolorosos anseios são agora aliviados, pela primeira vez e pelo menos temporariamente.

Apesar de, portanto, também poder sentir um conflito intenso, não consegue deixar de admitir que o alívio é imenso. Este sentimento temporário de conforto é tão profundo – indo bem além do simples prazer sexual que qualquer pessoa sente numa situação menos pesada – que essa experiência é fortemente reforçada. Por mais que lute, ele vai sentir-se profundamente impelido a repetir a experiência. E quanto mais o faz, mais ela fica reforçada e mais provável será que a venha a repetir novamente, apesar de frequentemente sentir que o resultado do prazer vai diminuindo [“diminishing returns”].

 

(7) Também descobre que, tal como para qualquer pessoa, o orgasmo é um poderoso aliviador para o sofrimento de todos os tipos. Ao se envolver em atividades homossexuais, ele já atravessou uma das mais críticas e mais fortemente estabelecidas barreiras de tabu sexual. Agora é fácil para ele atravessar também outras barreiras de tabu, especialmente o muito menos severo tabu relativo à promiscuidade. Em breve a atividade homossexual se torna no fator central e organizador da sua vida, à medida que lentamente vai adquirindo o hábito de recorrer a isso regularmente – já não apenas devido à sua necessidade originária por amor caloroso paterno, mas para aliviar ansiedades de qualquer tipo.

 

(8) Com o tempo, a sua vida passa a envolver mais sofrimento do que para a maioria das pessoas. Parte disso é, de fato, porque com frequência ele experiencia por parte dos outros uma fria falta de simpatia ou mesmo hostilidade, tal como os ativistas afirmam. As únicas pessoas que realmente parecem aceitá-los são outros gays, de tal modo que forma um laço ainda mais forte com eles enquanto “comunidade”. Mas não é verdade, como os ativistas afirmam, que sejam estes os únicos nem mesmo as principais razões do seu sofrimento. Muito dele é causado simplesmente pelo seu modo de vida – por exemplo, as consequências na saúde, e a AIDS/SIDA, apesar de ser a pior, é apenas uma entre muitas. Ele também vive com a culpa e vergonha que inevitavelmente sente sobre o seu comportamento sexual compulsivo e promíscuo; e também sobre a noção de que não se consegue relacionar efetivamente com o sexo oposto e que é menos provável que tenha uma família (uma perda psicológica que campanhas políticas por casamento, adoção e direitos de herança para homossexuais nunca podem compensar adequadamente).

Por mais que os ativistas tentem normalizar para ele estes padrões de comportamento e as perdas que provocam, e por mais que seja eficaz para objetivos políticos escondê-los do grande público, a não ser que ele desligue enormes áreas da sua vida emocional, ele simplesmente não pode olhar honestamente para si nesta situação e ficar contente.

E ninguém – nem mesmo o “homofóbico” mais genuíno, absoluto e sexualmente inseguro – será tão duro com ele do que ele é consigo mesmo. Além disso, as mensagens auto-condenatórias com que se debate todos os dias são de fato apenas reforçadas pelo humor [“wit”] amargo e auto-depreciativo da própria cultura gay que abraçou. Os ativistas que o cercam continuam a dizer-lhe que tudo é causado pela “homofobia internalizada” da cultura envolvente, mas ele sabe que não é.

As tensões de “ser gay” conduzem a mais, não a menos, comportamento homossexual. Este princípio, talvez surpreendente para o leigo (pelo menos o leigo que não se viu a si mesmo envolvido nalgum padrão de comportamento, de qualquer tipo), é típico do ciclo compulsivo ou aditivo do comportamento auto-destrutivo; a deterioração causada pela culpa, vergonha e auto-condenação só o faz aumentar. Não surpreende, então, que as pessoas recorram à negação para se libertarem desses sentimentos, tal como ele o faz. Ele diz a si mesmo, “Não é o problema, portanto não há razão nenhuma para que me sinta tão mal sobre isso.”

 

(9) Após lutar com esta culpa e vergonha durante tantos anos, o rapaz, agora um adulto, passa a acreditar, compreensivelmente – e por causa da sua negação, precisa de acreditar – “Eu realmente não posso mudar, nem que quisesse, porque esta condição é imutável.” Se, nem que apenas por um momento, ele pense de outra forma, imediatamente surge a questão dolorosa, “Então porque não o fiz...?” e com ela regressa toda a vergonha e culpa.

Deste modo, quando chega o momento em que o rapaz se torna num homem, ele já construiu um determinado ponto de vista: “Eu sempre fui diferente, sempre fui um estranho. Tive paixões por rapazes desde que me lembro e a primeira vez que me apaixonei foi por um rapaz, não por uma rapariga. Eu não tinha qualquer verdadeiro interesse em membros do sexo oposto. Oh sim, eu tentei – desesperadamente. Mas as minhas experiências sexuais com raparigas não foram nada de especial. No entanto, a primeira vez que tive sexo homossexual tudo “bateu certo”. Portanto, faz todo o sentido para mim que a homossexualidade seja genética. Já tentei mudar – Deus sabe o quanto eu lutei – e simplesmente não consigo. Isso é porque não se pode mudar. Finalmente, parei de lutar e simplesmente aceitei a mim mesmo tal como sou.”

 

(10) As atitudes sociais em relação à homossexualidade vão desempenhar um papel quanto à maior ou menor probabilidade de que o homem venha a adotar uma perspetiva “genética e imutável”, e o momento do seu desenvolvimento em que isso possa acontecer. É óbvio que uma visão de mundo que normalize a homossexualidade, quando amplamente partilhada e propagada, vai aumentar a probabilidade de que ele adote essas crenças, e mais cedo, quando é mais novo. Mas talvez seja menos óbvio – no seguimento daquilo que abordámos anteriormente – que a ridicularização, a rejeição e uma condenação severamente punitiva de si mesmo enquanto pessoa irá ter a mesma probabilidade (se não maior) de o conduzir à mesma posição.

 

(11) Se ele mantiver o seu desejo por uma vida de família tradicional, o homem pode continuar a lutar contra a sua “segunda natureza”. Dependendo de quem encontre, ele pode manter-se aprisionado entre a condenação heterossexual [straight] e o ativismo gay, tanto em instituições seculares como religiosas. A mensagem mais importante que ele precisa escutar é que “a recuperação ou cura é possível”.

 

(12) Se inicia o caminho para a recuperação, ele vai descobrir que a estrada é longa e difícil – mas extraordinariamente preenchedora. O percurso até à restauração completa da heterossexualidade dura tipicamente mais do que do o casamento Americano médio – isto deve ser entendido como um índice de quão arruinadas todas as relações estão hoje em dia.

Com as terapias seculares, ele vai encontrar um entendimento sobre qual é a verdadeira natureza dos seus anseios, que não se tratam realmente de sexo, e que ele não se define pelos seus apetites sexuais. Nesse tipo de contexto, ele muito possivelmente aprenderá como se relacionar plenamente com outros homens de modo a ganhar deles uma genuína e não sexualizada camaradagem e intimidade; e como se relacionar devidamente com uma mulher, enquanto amiga, amante, companheira de vida, e, se Deus quiser, mãe dos seus filhos.

Claro que as velhas feridas não irão simplesmente desaparecer, e mais tarde, em momentos de sofrimento profundo, os velhos caminhos de fuga irão atrair. Mas a afirmação de que isso significa que ele é “realmente” um homossexual que nunca mudou é uma mentira. Pois, à medida que vive uma nova vida com cada vez mais honestidade e cultiva uma intimidade genuína com a mulher do seu coração, os novos padrões vão crescer cada vez mais fortes e os velhos, gravados nas sinapses do seu cérebro, cada vez mais fracos.

Com o tempo, ao compreender realmente o pouco que esses padrões tinham que ver com sexo, ele vai mesmo chegar a um respeito pelas ténues turbulências que restam dos velhos impulsos e dar-lhes um bom uso. Serão para ele como um tipo de aviso antes da tempestade, um sinal de que algo não está em ordem na sua casa, de que algum velho padrão de anseio e rejeição e defesa está a ser ativado. E irá descobrir que, assim que coloca a sua casa em ordem, todos os velhos impulsos novamente diminuem. Nas suas relações com outros – como amigo, marido, profissional – ele tem agora um dom especial. Aquilo que era antes sentido como uma maldição se transformou numa benção, para si e para os outros.